10.24873/j.rpemd.2023.07.1059

Investiga��o Original

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A ansiedade, medo e stress nos Profissionais de Sa�de Oral durante o primeiro ano de pandemia por Covid-19

Anxiety, fear, and stress in oral health professionals during the first year of the covid-19 pandemic

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Ana Rita Rodrigo¹ 0009-0004-4374-7240

In�s Morais^1,2,3 Caldas 0000-0003-0706-3242

Bruna Carvalho¹ 0000-0002-4002-9962

�lvaro Azevedo^1,4,5 0000-0002-1014-6148

Maria de Lurdes Ferreira Lobo Pereira^1,4,5 0000-0002-4076-6014

¹ Faculdade de Medicina Dent�ria da Universidade do Porto, Porto. Portugal.

² TOXRUN � Unidade de Investiga��o em Toxicologia, Instituto Universit�rio de Ci�ncias da Sa�de, CESPU, Gandra, Portugal

³ Centro de Ecologia Funcional. Departamento das Ci�ncias da Vida Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal

⁴ EPIUnit, Instituto de Sa�de P�blica, Universidade do Porto, Porto, Portugal.

⁵ Laborat�rio para a Investiga��o Integrativa e Translacional em Sa�de Populacional (ITR), Porto, Portugal.

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^*Correspond�ncia:

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Historial do artigo:

Recebido a 21 de abril de 2022

Aceite a 25 de maio de 2023

On-line a 30 de junho de 2023

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Resumo

Objetivos: Caracterizar o impacto da atual pandemia de COVID-19 na ansiedade, medo e stress nos profissionais de sa�de oral.

M�todos: Utilizou-se um question�rio autoaplicado online que foi enviado, via email, para tr�s associa��es na �rea da Medicina Dent�ria. As vari�veis categ�ricas foram descritas atrav�s de frequ�ncias absolutas e relativas. As vari�veis cont�nuas foram descritas utilizando a m�dia e o desvio-padr�o. Utilizou-se um modelo de regress�o linear m�ltipla para selecionar preditores da ansiedade avaliados no question�rio.

Resultados: Obteve-se uma taxa de participa��o de 21,1%. A maioria dos participantes era do sexo feminino (67,2%). Atrav�s da escala GAD-7 apur�mos que 18,3% dos profissionais apresentaram uma perturba��o de ansiedade moderada e grave. A maioria dos participantes (86,7%) referiu ter medo de infetar os familiares e amigos. Verific�mos que ser do sexo feminino, o medo de infetar a fam�lia e amigos, a possibilidade de a pandemia afetar negativamente a profiss�o, a perda de rendimentos e as novas condi��es de trabalho eram preditores estaticamente significativos para o aumento da ansiedade (p < 0,05). Pelo contr�rio, � medida que o n�mero de anos de pr�tica cl�nica aumenta, a ansiedade diminui significativamente (p=0,006).

Conclus�es: A pandemia de COVID-19 afetou negativamente os profissionais de sa�de oral. As medidas de preven��o e os protocolos de controlo de infe��o devem ser rigorosamente cumpridos, para que haja diminui��o da transmiss�o do v�rus e, consequentemente, diminua a ansiedade, o stress e o medo sentidos por estes profissionais.

Palavras-chave: Ansiedade, COVID-19, Dentistas, GAD-7, Medicina Dent�ria, Medo, Stress

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Abstract

Objectives: To characterize the impact of the current COVID-19 pandemic on anxiety, fear, and stress among oral health professionals.

Methods: We used an online self-applied questionnaire sent via email to three dental associations. Categorical variables were described using absolute and relative frequencies. Continuous variables were described using the mean and standard deviation. We used a multiple linear regression model to test whether the different variables in the questionnaire could predict anxiety.

Results: The participation rate was 21.1%, and most participants were female (67.2%). The GAD-7 scale revealed that 18.3% of the professionals presented moderate and severe anxiety disorder and 39.5% mild anxiety. Almost all participants (86.7%) feared infecting family and friends. The new working conditions affected the daily life of 42.8% of the individuals. Being female, being afraid of infecting family and friends, the pandemic negatively affecting the profession, losing income, and new working conditions were statistically significant predictors for increased anxiety (p < 0.05). On the contrary, as the number of years of clinical practice increased, anxiety decreased significantly (p=0.006).

Conclusions: The COVID-19 pandemic has negatively affected oral health professionals. Prevention measures and infection control protocols must be strictly followed to decrease v�rus transmission and, consequently, reduce the anxiety, stress, and fear felt by these professionals.

Keywords: Anxiety, COVID-19, Dentists, GAD-7, Dentistry, Fear, Stress

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Introdu��o

A pandemia de COVID-19 j� afetou milh�es de indiv�duos por todo o mundo e alterou a rotina profissional e pessoal das popula��es.¹ A defini��o de coronav�rus inclui uma gama de v�rus respirat�rios, que podem apresentar manifesta��es leves a graves e levar � insufici�ncia respirat�ria.^{2, 3} O v�rus respirat�rio SARS-CoV-2 � um membro da fam�lia de coronav�rus e pode ser transmitido direta ou indiretamente atrav�s de secre��es provenientes da saliva ou do nariz. Os profissionais de sa�de oral, como consequ�ncia da sua atividade profissional, apresentam um risco aumentado de exposi��o a este v�rus. ^{2, 4, 5} De facto, os profissionais de sa�de oral t�m um contacto pr�ximo com a cavidade oral dos pacientes e, por isso, s�o expostos �s secre��es respirat�rias, sangue, saliva, instrumentos contaminados com flu�dos corporais e aos aeross�is derivados dos diferentes procedimentos dent�rios, apresentando um elevado risco de cont�gio. ^{2 - 7} Desta forma, durante os per�odos iniciais da pandemia, os profissionais de sa�de oral, nomeadamente os M�dicos Dentistas, poder�o ter sido confrontados com a incerteza do seu emprego, dos seus rendimentos e com limita��es de trabalho, situa��es que podem em muitos casos ter levado a instabilidade emocional, cognitiva, psicol�gica, social, afetiva e profissional.^{8 - 11} O v�rus SARSCoV- 2, para al�m de afetar a sa�de f�sica, tem sido descrito como causa de impactos psicol�gicos, como o stress, a ins�nia, a depress�o, a frustra��o, a raiva e o medo relacionados com a incerteza do surto. ^{11 - 14} Os profissionais de sa�de oral tiveram, pois, de mudar a sua rotina cl�nica, adaptando-se a restri��es de trabalho exigentes, novos protocolos, equipamento de prote��o individual (EPI), atitudes e comportamentos, e, apesar de todas as recomenda��es de trabalho impostas, s�o expostos a n�veis de stress e ansiedade ainda mais elevados, n�o s� por serem mais vulner�veis a contrair o v�rus SARS-CoV-2 e, consequentemente, terem medo de infetar outros indiv�duos, nomeadamente os familiares, como tamb�m pelas novas condi��es de trabalho a que foram sujeitos no dia a dia.^{8 - 10} Certas situa��es como o medo, a ansiedade, o stress, o cansa�o f�sico e mental s�o emo��es fortes reportadas diariamente pelos profissionais de sa�de, particularmente pelos M�dicos Dentistas e M�dicos Estomatologistas. Estas emo��es podem levar a dificuldades no relacionamento com os pacientes e pessoas pr�ximas, a erros nos procedimentos dent�rios, � diminui��o da qualidade de sono e a uma insatisfa��o profissional.^{8 - 10} Os fatores que causam stress evocam incerteza sobre o impacto que ter�o num individuo e est�o relacionados com algo de valor para ele, como, por exemplo, quest�es relacionadas com a sa�de, a fam�lia, finan�as, perda de normalidade de vida e luto.^{15 16,} A ansiedade, em concreto, � a manifesta��o de uma emo��o, caracterizada por um desconforto f�sico e psicol�gico descrito pelos indiv�duos como um sentimento de inquieta��o, nervosismo e preocupa��o excessiva.¹⁷ Uma das perturba��es de ansiedade mais comuns observadas na pr�tica m�dica geral e na popula��o em geral � o transtorno de ansiedade generalizada (General Anxiety Disorder � GAD). A escala de transtorno de ansiedade generalizada (GAD-7) � um dos instrumentos mais frequentemente utilizados para rastreio, diagn�stico e avalia��o da gravidade da ansiedade.^{18, 19} Assim, o presente estudo teve como objetivo caracterizar o impacto da pandemia de COVID-19 no medo, no stress e na ansiedade e seus fatores associados, entre os profissionais de sa�de oral, durante o primeiro ano do seu curso.

Material e m�todos

Este estudo, de tipo transversal, teve como popula��o-alvo os profissionais de sa�de oral, nomeadamente M�dicos Dentistas e M�dicos Estomatologistas Portugueses inscritos em tr�s organiza��es corporativas nacionais.

O question�rio realizado para colher os dados foi enviado, via email, com o link de acesso ao question�rio, dispon�vel na plataforma Google Forms, com uma conta institucional Google For Education para as seguintes associa��es: Sociedade Portuguesa de Estomatologia e Medicina Dent�ria (SPEMD), com um universo de cerca 2291 associados, tendo sido enviados com sucesso 1680 emails; Associa��o Portuguesa dos M�dicos Dentistas dos Servi�os P�blicos (APOMED), com um universo de 57 associados; Associa��o Independente dos M�dicos Dentistas (AIMD), com um universo de 108 associados. Cada associa��o disponibilizou o link aos respetivos associados. Durante o per�odo de dezembro 2020 a fevereiro de 2021, um total de 390 M�dicos Dentistas e M�dicos Estomatologistas responderam ao estudo.

O question�rio era constitu�do por perguntas de escolha m�ltipla e organizado em tr�s partes. A primeira parte abordava quest�es relativas � carateriza��o sociodemogr�fica e foram recolhidas informa��es referentes � idade, sexo, estado civil, ano de forma��o acad�mica, local de trabalho, regi�o onde exerce a atividade cl�nica e, por �ltimo, se assistiu a alguma forma��o sobre o SARS-CoV-2.

Na segunda parte, de forma a caracterizar a ansiedade, utiliz�mos o question�rio de Transtorno de Ansiedade Generalizada (General Anxiety Disorder - GAD-7), constitu�do por sete quest�es para avaliar a frequ�ncia de viv�ncias e perce��es durante as duas �ltimas semanas no decorrer do estado pand�mico. Para cada quest�o existiam quatro possibilidades de resposta. Os participantes avaliavam a frequ�ncia em que experimentaram cada problema: �n�o experimentei estes problemas�, �v�rios dias�, �mais de metade dos dias�, �quase todos os dias�.

O �ndice GAD-7 � obtido adicionando as pontua��es do question�rio, depois de ter atribu�do 0 � situa��o menos grave (n�o experimentei estes problemas), 3 � mais grave (quase todos os dias) e 1 e 2 para as situa��es interm�dias (v�rios dias e mais de metade dos dias, respetivamente). A pontua��o final de 5, 10 e 15 pontos permite-nos classificar a ansiedade como nenhuma/normal (0-4), suave (5-9), moderada (10-14), e grave (15-21). Qualquer indiv�duo que obtenha uma pontua��o igual ou superior a 8 pode ser considerado portador de sintomas de ansiedade significativos.

Por fim, na terceira parte, os participantes foram questionados relativamente a situa��es de medo e stress, tais como: quantas vezes se sentiu emocional e fisicamente exausto durante a pandemia; avalia��o do medo de ficar infetado e infetar os respetivos familiares e amigos; avaliar o impacto da pandemia de COVID-19 na atividade profissional: ansiedade em ir trabalhar, impacto das novas condi��es de trabalho, preocupa��es relativas � perda de rendimentos/emprego durante o confinamento. Estas quest�es foram elaboradas com base em question�rios disponibilizados na literatura. ^{8, 9, 17}

O estudo obteve parecer favor�vel da Comiss�o de �tica para a Sa�de da Faculdade de Medicina Dent�ria da Universidade do Porto e da Unidade de Prote��o de Dados da Universidade do Porto. Foi assegurada a confidencialidade e o anonimato das respostas a todos os participantes.

Foi utilizado o programa estat�stico IBM SPSS Statistics 26^� (Statistical Package for Social Science) para a an�lise estat�stica dos dados. As vari�veis categ�ricas foram descritas atrav�s de frequ�ncias absolutas e relativas. As vari�veis quantitativas foram descritas utilizando a m�dia e o desvio-padr�o (m�dia�desvio-padr�o). Utiliz�mos o modelo de regress�o linear m�ltipla para, a partir do question�rio, testar a exist�ncia de vari�veis preditoras da ansiedade. Em todas as an�lises foi considerado um n�vel de signific�ncia de 5%.

Resultados

De uma popula��o acess�vel de 1845 profissionais de sa�de oral, foi obtida uma amostra de conveni�ncia (n=390), tendo-se registado uma taxa de participa��o na resposta ao question�rio de 21,1%.

Na Tabela 1 apresenta-se as caracter�sticas sociodemogr�ficas dos participantes. Verificou-se que a maioria dos participantes era do sexo feminino e eram casados ou viviam em uni�o de facto, 67,2% e 62,8%, respetivamente. A idade dos participantes variou entre 23 e 70 anos, 42,96�11,294. O n�mero de anos de pr�tica cl�nica foi de 18,73�10,792 e variou entre o m�nimo de um e o m�ximo de 47 anos. Relativamente ao local de trabalho, 51,8% dos participantes trabalhavam em cl�nica pr�pria e 55,9% trabalhavam por conta de outrem.

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Tabela 1. Caracteriza��o sociodemogr�fica da amostra (n=390)

*Quest�o com possibilidade de escolha de v�rias op��es

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Quanto � regi�o do local de trabalho, 48,2% trabalhava no Norte, 33,3% no Centro, 17,4% no Sul e apenas 1% trabalhava na Regi�o Aut�noma da Madeira. Foi ainda questionado se assistiram a alguma forma��o sobre o v�rus SARS-CoV-2, e cerca 74% dos inquiridos responderam afirmativamente.

A Tabela 2, mostra os dados relativos ao question�rio GAD-7. Mais de metade dos dias ou quase todos os dias durante a pandemia, 21% dos participantes responderam que se sentiram nervosos, ansiosos ou muito tensos e 13% declararam n�o conseguir impedir ou controlar as preocupa��es. A maioria (52,3%) dos participantes respondeu que se preocupava muito com diversos aspetos durante v�rios dias. Cerca de 22,1% dos participantes relataram dificuldade em relaxar e 6,7% declararam ficar agitados, tornando-se dif�cil permanecerem sentados, em mais de metade dos dias ou quase todos os dias. A maioria (58,2%) destes profissionais de sa�de oral ficou aborrecida ou irritada em v�rios dias e 42,6% sentiram medo como se algo horr�vel fosse acontecer. A maioria dos participantes (52,8%) relatou que todos os t�picos questionados no GAD-7 lhe dificultaram um pouco o trabalho, o cuidado em casa e o conv�vio com outras pessoas. Enquanto 36,4% n�o sentiram qualquer dificuldade, 9,5% e 1,3% sentiram muita dificuldade e dificuldade extrema, respetivamente.

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Tabela 2. Caracteriza��o da ansiedade dos participantes atrav�s do question�rio GAD-7 (n=390)

Resultados expressos em % (n)

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Representamos na Tabela 3 o grau de ansiedade estimado atrav�s da aplica��o do question�rio GAD-7. Verific�mos que 18,3% dos participantes apresentaram uma perturba��o generalizada de ansiedade moderada e grave e 39,5% ansiedade leve.

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Tabela 3. Distribui��o do grau de ansiedade dos participantes de acordo com o question�rio GAD-7

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Na Tabela 4 mostra-se a avalia��o do impacto da pandemia de COVID-19 no medo e stress relativa � atividade profissional dos participantes e � vida pessoal. Destes, 39,2% sentiram-se fisicamente exaustos e 29,7% sentiram-se emocionalmente exaustos, uma a duas vezes por semana. Um total de 86,7% declararam medo dos familiares e amigos se poderem infetar em resultado da sua exposi��o di�ria no trabalho, enquanto 18,7% assumiram muito medo de ficar infetados com o v�rus.

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Tabela 4. Caracteriza��o do impacto da pandemia de COVID-19 na atividade profissional dos participantes (n=390)

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Mais de metade dos profissionais (55,2%) sentiram-se ansiosos em ir trabalhar diariamente e, devido � pandemia, aproximadamente 90% destes indiv�duos foram afetados negativamente na sua atividade profissional. Um n�mero consider�vel destes profissionais (44,6%) preocupou-se muito com a perda de rendimentos, consequ�ncia do encerramento das cl�nicas. No que toca �s novas condi��es de trabalho impostas, estas afetam muito o dia a dia de 42,8% dos participantes.

Na Tabela 5 apresentam-se os resultados relativos aos fatores preditivos da ansiedade nos profissionais de sa�de oral, durante a pandemia do v�rus SARS-CoV-2.

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Tabela 5. Modelo da regress�o linear m�ltipla preditivo da ansiedade nos Profissionais de Sa�de Oral durante a pandemia do SARS-CoV-2

p = N�vel m�nimo de signific�ncia (p<0,05); Vari�vel dependente: Score GAD-7

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Foi estimado um modelo de regress�o linear m�ltipla estatisticamente significativo (R2 ajustado=0,299). Ser do sexo feminino (B=1,549; p<0,001), ter medo de infetar fam�lia e amigos (B=1,444; p=0,005), o facto de a pandemia afetar negativamente a atividade profissional (B=2,375; p<0,001), a perda de rendimentos (B=1,081; p=0,017) e as novas condi��es de trabalho (B=1,050; p=0,022) s�o fatores preditivos da ansiedade. O facto de ter assistido a alguma forma��o sobre o SARS-CoV-2 (B=0,016; p=0,972) e o medo de ficar infetado (B=0,963; p=0,091) n�o evidenciaram de forma estatisticamente significativa uma rela��o com a ansiedade. Contudo, a ansiedade apresentou uma rela��o inversa e estatisticamente significativa com o aumento dos anos de pr�tica, (B=-0,053; p=0,006).

Discuss�o

A pandemia de COVID-19 teve um impacto negativo na pr�tica da Medicina Dent�ria, n�o s� a n�vel profissional, como tamb�m a n�vel pessoal, no que se refere ao medo, ansiedade e preocupa��es com repercuss�o nos h�bitos de trabalho e de bem-estar.^{14, 20} O presente estudo teve como objetivo avaliar a ansiedade e seus fatores associados, o medo e o stress nos profissionais de sa�de oral durante a per�odo pand�mico.

Numa pandemia, os n�veis de ansiedade, medo e stress aumentam. Os profissionais de sa�de t�m uma taxa maior de preocupa��o do que o resto da popula��o em geral devido ao elevado risco de infe��o.²¹ A probabilidade dos profissionais de sa�de oral ficarem infetados e transmitirem o v�rus � elevada, uma vez que os procedimentos dent�rios incluem proximidade com os pacientes e envolvem um elevado n�mero de got�culas e aeross�is provenientes dos atos cl�nicos, sendo esta uma potencial via de transmiss�o do v�rus.⁸

A sobrecarga f�sica, juntamente com o impacto psicol�gico resultante de uma pandemia, aumentou os n�veis de ansiedade nos profissionais de sa�de.⁸

Um estudo realizado na China,²² onde foram abordados fatores associados � sa�de mental entre os profissionais de sa�de, demonstrou que, atrav�s da escala de Transtorno de Ansiedade Generalizada � 7 (GAD-7), 44,6% dos participantes apresentavam sintomas de ansiedade. No presente estudo, us�mos tamb�m a escala GAD-7 para avaliar a ansiedade e um total de 18,3% dos participantes mostraram sentir-se ansiosos.

Essa ansiedade variou entre moderada a grave. Similarmente, noutro estudo, onde participaram 151 m�dicos dos hospitais de uma cidade do Qu�nia, demonstrou-se que 17,9% dos participantes tinham tamb�m ansiedade moderada e grave. A maioria desses participantes era do sexo feminino, o que � compar�vel com o estudo realizado na China e que vai ao encontro dos resultados do presente estudo, em que os inquiridos eram predominantemente mulheres. Na literatura foi encontrado que as mulheres apresentam maior possibilidade de experimentarem stress, ansiedade e depress�o.23 Estes resultados s�o equipar�veis ao estudo de Salehiniya H. et al.,²⁴ e de outra investiga��o realizada na Alemanha,²⁵ em que as mulheres Dentistas experienciaram mais ansiedade do que os homens durante a pandemia de COVID-19. Isto pode ser fundamentado no facto das mulheres terem um contacto mais pr�ximo com os filhos, pelo que a probabilidade de lhes transmitir a infe��o poder aumentar a ansiedade e o medo, em compara��o com os profissionais do sexo masculino.^{26, 27} Similarmente, em estudos realizados na Ar�bia Saudita, ²⁸ a ansiedade foi tamb�m significativamente mais alta nas mulheres, incluindo enfermeiras e oftalmologistas.

Estudos sobre surtos com infe��es similares, como a S�ndrome Respirat�ria Aguda Grave (SARS), demonstraram que v�rios fatores levaram a traumas psicol�gicos nos profissionais de sa�de, incluindo o medo de ficar infetado enquanto contactam com um doente potencialmente infetado e, posteriormente, de infetar a fam�lia.^{29, 30} O mesmo acontece com os profissionais de sa�de oral que, devido ao modo de transmiss�o do v�rus SARS-CoV-2 experimentam os mesmos receios no que refere � transmiss�o do v�rus para a fam�lia.⁸ No nosso estudo, a maioria dos participantes referiu ter medo de infetar a fam�lia. Resultados semelhantes foram observados num estudo realizado na Turquia,³¹ e num estudo realizado no Paquist�o,³² em que 92% e 95%, respetivamente, revelaram ter medo de transmitir o v�rus � fam�lia.

A pandemia de COVID-19 n�o s� afetou o bem-estar emocional dos indiv�duos, como tamb�m desencadeou uma recess�o econ�mica em quase todos os setores, onde a empregabilidade ficou em risco, e a Medicina Dent�ria n�o foi exce��o.

Uma das grandes preocupa��es e receios dos participantes deste estudo foi a perda do emprego ou a perda de rendimentos na atividade cl�nica. Estas implica��es econ�micas poder�o justificar-se atrav�s da elevada exig�ncia de investimento nos procedimentos de controlo de infe��es, das novas condi��es de trabalho e dos protocolos de preven��o impostos que afetaram o dia a dia destes profissionais e da menor aflu�ncia de pacientes durante este per�odo.^{26, 33} Estes fatores poder�o explicar o elevado n�vel de ansiedade que se refletiu num n�mero consider�vel de M�dicos Dentistas deste estudo.

A forma r�pida como esta pandemia se propagou, a elevada taxa de letalidade, o risco de contactar com um hospedeiro assintom�tico, o per�odo de incuba��o, as poss�veis sequelas resultantes da doen�a, a inexist�ncia de um tratamento eficaz e a incerteza no futuro, aumentaram a carga psicol�gica entre os M�dicos Dentistas e M�dicos Estomatologistas. Paralelamente, a necessidade de implementa��o de novos protocolos na pr�tica cl�nica, incluindo o uso de equipamento de prote��o individual apropriado, procedimentos de higieniza��o eficientes com a utiliza��o correta dos equipamentos de prote��o e a implanta��o de protocolos de higieniza��o entre pacientes, desencadeou um prov�vel aumento do stress e ansiedade nestes indiv�duos em rela��o ao futuro desta profiss�o.^{4, 6} � de real�ar que todos estes fatores podem justificar a elevada frequ�ncia de cansa�o f�sico e emocional sentidos por estes profissionais nesta investiga��o.

Existe literatura dispon�vel que classifica a Medicina Dent�ria como uma profiss�o com altos n�veis de stress. ²⁵ Lidar com pacientes dif�ceis ou nervosos, saber estabelecer uma rela��o m�dico-paciente, trabalhar sobre press�o de tempo e hor�rios, fatores econ�micos, rendimentos e excesso de trabalho semanal s�o os fatores principais que causam stress nos M�dicos Dentistas, segundo um estudo realizado por Myers et al..³⁴ A pandemia de COVID-19 e as consequ�ncias dela provenientes parecem ter contribu�do para um aumento do stress entre estes profissionais.³⁵

Mishra et al.³⁵ relataram que 62,5% dos M�dicos Dentistas de um estado da �ndia lidaram com stress psicol�gico e que os fatores de stress mais sentidos por estes foram a preocupa��o em contrair o v�rus e as implica��es financeiras associadas. Estas conclus�es s�o semelhantes aos resultados que obtivemos neste estudo, visto que estes fatores foram tamb�m os mais relatados com maior taxa de preocupa��o, o que poder� ser a causa do aumento do stress e da ansiedade nestes indiv�duos.

O medo de infetar a fam�lia e amigos, o facto de a pandemia afetar negativamente a atividade profissional e a incerteza dos rendimentos tamb�m aumentam a ansiedade. Em contrapartida, a ansiedade diminui com o aumento de anos de pr�tica cl�nica, � semelhan�a de um estudo realizado sobre o impacto da pandemia no setor da Medicina Dent�ria, no Iraque.³⁶ mostraram que os indiv�duos com menos de 35 anos s�o mais propensos a terem sintomas de ansiedade. Embora a morte, o risco de doen�a e a probabilidade de desenvolver sintomas respirat�rios graves aumentem com a idade, estes resultados podem ser explicados pelo facto de os M�dicos Dentistas mais velhos terem mais experi�ncia cl�nica, conhecimentos e serem mais suscet�veis de terem lidado com situa��es dif�ceis, como o relato de pandemias passadas, doen�as infeciosas e crises financeiras, em compara��o com os indiv�duos mais novos, que t�m menos experi�ncia profissional. Deste modo, os profissionais mais velhos poder�o tornar-se mais confiantes, mais resilientes e menos propensos � ansiedade.^{25 26 37 - 39}

Face ao medo e ansiedade demonstrados pela comunidade dos profissionais de sa�de oral durante o per�odo da pandemia, � necess�rio que se adotem mecanismos e estrat�gias para, n�o s� diminuir estes aspetos, como fortalecer os mecanismos de autocontrolo com repercuss�o positiva na pr�tica cl�nica e respetiva minimiza��o na probabilidade de transmiss�o do v�rus. Deste modo, torna-se imprescind�vel que estes profissionais sigam meticulosamente as recomenda��es emitidas pelas autoridades reguladoras, incluindo protocolos de controlo de infe��es cruzadas e rastreio pr�vio dos pacientes se a situa��o epidemiol�gica assim o determinar.⁴⁰ No entanto, pensamos que o processo de viv�ncias � din�mico e a experi�ncia obtida ao longo do per�odo pand�mico, o comportamento do v�rus no que diz respeito ao aparecimento de muta��es, bem como o processo de vacina��o generalizado que se observou em Portugal poder� em estudos futuros alterar a resposta dos participantes.

A inacessibilidade � totalidade de m�dicos dentistas e estomatologistas em exerc�cio em Portugal (popula��o-alvo) e a taxa de participa��o efetiva nos inqu�ritos rececionados representam uma limita��o deste estudo, em particular se considerarmos o facto do m�todo de amostragem n�o ter sido aleat�rio.

Adicionalmente, os profissionais com anteriores perturba��es de ansiedade, ou a fazerem medica��o para tal, podem ter respondido que a pandemia n�o os afetava e, eventualmente, os que responderam foram os mais afetados pelos efeitos da pandemia. Este estudo n�o avaliou os antecedentes dos inquiridos em termos de condi��es de sa�de mental anteriores � pandemia de COVID-19, fator que poderia ter influenciado nas respostas ao question�rio aplicado. Assim, os fatores descritos anteriormente, a aplica��o de modelos de regress�o linear e o car�cter multifatorial das diferentes manifesta��es caracterizadas por falta de bem-estar emocional d�o consist�ncia ao facto de se ter obtido uma percentagem de variabilidade explicada de 29,9%.

A utiliza��o de um question�rio autoaplicado online para recolha de informa��o tem algumas limita��es, principalmente a falta de conhecimento das circunst�ncias em que o question�rio foi preenchido, o que pode ter influenciado a qualidade e a quantidade das respostas obtidas e, desta forma, incrementar o erro de vi�s e condicionar a validade externa do estudo.

Apesar das limita��es do m�todo aplicado, entendemos que a autoaplica��o de um question�rio seria a mais adequada, tendo em conta o n�vel de literacia dos participantes, e a dificuldade de aplica��o do question�rio em papel, face ao n�mero de omiss�es que habitualmente proporciona. Acrescente-se a oportunidade do presente estudo por ser o primeiro que caracteriza o impacto da pandemia neste setor profissional em Portugal.

Conclus�es

Com o presente estudo constat�mos que os profissionais de sa�de oral foram afetados pela pandemia de COVID-19, tendo implica��es na sa�de mental. O modo de transmiss�o do v�rus, o elevado risco de cont�gio no decorrer da atividade cl�nica e o medo de infetar a fam�lia aumentaram a ansiedade, medo e stress, principalmente numa fase precoce da pandemia. A ansiedade aumentou no sexo feminino e diminuiu com o aumento da pr�tica cl�nica. A atividade da Medicina Dent�ria sofreu altera��es na sua pr�tica di�ria e, em conformidade com os protocolos recomendados para evitar a infe��o cruzada com repercuss�o financeira e econ�mica, deixou estes profissionais reticentes face ao futuro da profiss�o.

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^*Autor correspondente:

�lvaro Amadeu Ferreira de Azevedo

Correio eletr�nico: aazevedo@fmd.up.pt

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Agradecimentos

Os autores gostariam de agradecer � SPEMD, AIMD e APOMED pela disponibiliza��o e pelo contributo imprescind�vel neste projeto e a todos os participantes que tornaram este estudo poss�vel.

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Conflito de interesses

Os autores declaram n�o haver conflito de interesses.

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Responsabilidades �ticas

Prote��o de pessoas e animais. Os autores declaram que para esta investiga��o n�o se realizaram experi�ncias em seres humanos e/ou animais.

Confidencialidade dos dados. Os autores declaram ter seguido os protocolos do seu centro de trabalho acerca do acesso aos dados de pacientes e sua publica��o.

Direito � privacidade e consentimento escrito. Os autores declaram que n�o aparecem dados de pacientes neste artigo.

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Declara��o de contribui��o dos autores � CRediT

Ana Rita Rodrigo: Conceitualiza��o, Investiga��o, Metodologia, Reda��o do rascunho original. In�s Morais Caldas: Reda��o � revis�o e edi��o. Bruno Carvalho: Reda��o � revis�o e edi��o. �lvaro Azevedo: Curadoria dos dados, An�lise formal, Reda��o � revis�o e edi��o. Maria de Lurdes Ferreira Lobo Pereira: Conceitualiza��o, Curadoria dos dados, An�lise formal, Reda��o � revis�o e edi��o.

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1646-2890/� 2023 Sociedade Portuguesa de Estomatologia e Medicina Dent�ria. Published by SPEMD.

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