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Revista Portuguesa de Estomatologia, Medicina Dentária e Cirurgia Maxilofacial

SPEMD | 2019 | 60 (4) | 210-215




Caso ClÍnico

Tumor de células granulares intra-orais: apresentação de dois casos clínicos

Intraoral granular cell tumor: presentation of two clinical cases


a Universidade de Uberaba (UNIUBE), Mestrado em Odontologia, Uberaba, MG, Brazil
b Universidade de Uberaba (UNIUBE), Hospital Universitário Mario Palmério, Residência Odontológica, Uberaba, MG, Brazil
c Universidade de Uberaba (UNIUBE), Hospital Universitário Mario Palmério, Otorrinolaringologia, Uberaba, MG, Brazil
d Universidade de Uberaba (UNIUBE), Curso de Odontologia, Patologia Oral e Maxilofacial, Uberaba, MG, Brazil
Marcelo Sivieri de Araújo - msivieri68@gmail.com

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Volume - 60
Issue - 4
Caso ClÍnico
Pages - 210-215
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Received on 31/05/2019
Accepted on 09/10/2019
Available Online on 22/10/2019


Caso Clínico

 

Tumor de células granulares intra-orais: apresentação de dois casos clínicos

Intraoral granular cell tumor: presentation of two clinical cases

 

Janaina M. de Freitasa, Leopoldo Lúcio da Matab, Renato de Queiroz Ramosc, Marcelo Sivieri de Araújod,*

a Universidade de Uberaba (UNIUBE), Mestrado em Odontologia, Uberaba, MG, Brazil

b Universidade de Uberaba (UNIUBE), Hospital Universitario Mario Palmerio, Residencia Odontologica, Uberaba, MG, Brazil

c Universidade de Uberaba (UNIUBE), Hospital Universitario Mario Palmerio, Otorrinolaringologia, Uberaba, MG, Brazil

d

Universidade de Uberaba (UNIUBE), Curso de Odontologia, Patologia Oral e Maxilofacial, Uberaba, MG, Brazil

 

*Correspondence to:

 

http://doi.org/10.24873/j.rpemd.2019.10.457

 

Resumo

O tumor de célula granular (TCG) e uma lesão benigna incomum que ocorre em indivíduos adultos de meia idade, onde a língua e mucosa jugal são áreas intra-orais mais acometidas, podendo ser encontrado nos maxilares, pele, trato gastrintestinal e respiratório. Sua histogénese ainda e incerta, mas, estudos imunohistoquimicos e ultraestruturais sugerem como origem da lesão, as células de Schwann, músculos estriados, células mesenquimais, histiocitos e células epiteliais. As lesões se manifestam como massas assintomáticas não inflamadas, com diâmetro pequeno e superfície amarelada. O tratamento de escolha e a excisão cirúrgica da lesão com recidiva rara. São descritos neste trabalho, dois casos clínicos de TCG, que acometeram uma criança de 11 anos de idade e um homem adulto, onde em ambos os casos foi realizada a remoção total da lesão, exame histopatologico e imunohistoquimico e acompanhamento clinico superior a 10 anos, com ausência de recidiva.

Palavras-chave: Adulto, Crianca,Mioblastoma de celulas granulares,Neoplasia oral,Tumor de celulas granulares

 

Abstract

The granular cell tumor (GCT) is an uncommon benign lesion that is more common in middle-aged adults. The tongue and the jugal mucosa are the most frequently affected intraoral sites. However, this tumor may also be found in the jaw, skin, and the gastrointestinal and respiratory tracts. Its histogenesis is still uncertain, but immunohistochemical and ultrastructural studies suggest that it originates from Schwann cells, striated muscle, mesenchymal cells, epithelial cells and histiocytes. GCT presents as a small, yellowish, painless mass. The treatment is the surgical excision of the tumor, but recurrences are possible. Two cases of GCT are reported in this paper: one in an 11-year-old child and another in an adult male. In both cases, complete tumor excision was performed and followed by histopathological and immunohistochemical examinations. The two patients were monitored for 10 years after the treatment and no recurrences were observed.

Keywords: Adult, Children,Granular cell myoblastoma,Oral neoplasm, Granular cell tumor

 

Introdução

O tumor de células granulares (TCG) é um tumor benigno e raro, caracterizado pelo acúmulo de células grandes e poligonais com citoplasma granular abundante. Esta neoplasia foi descrita por Abrikossoff em 1926, que a considerou como sendo de origem miogênica (Mioblastoma de célula granular),1 entretanto, a origem muscular postulada por Abrikossoff, não perdurou por muito tempo, já que mioblastos, histiócitos, fibroblastos, células mesenquimais indiferenciadas e células de schwann, têm sido citadas como participantes da histogénese da lesão.2

O TCG comumente pode ocorrer na cavidade oral, particularmente na parte anterior da língua. É um nódulo solitário e assintomático. Alguns autores demonstram ligeira predilecção para o gênero feminino, enquanto outros, relatam não haver diferença quanto ao gênero. Ocorre frequentemente entre a quarta e sexta década de vida, sendo considerada rara a ocorrência em crianças. O tratamento consiste em excisão conservadora com recorrências raras. Casos de malignização do TCG são raros, ocorrendo em apenas 1% ou 2% de casos, em lesões que apresentam comportamento agressivo, passando as células a exibir necrose, núcleos delgados e vesiculares, nucléolos grandes, aumento da atividade mitótica, relação núcleo citoplasma alterada e presença de pleomorfismo nuclear e celular.3

Em relação aos aspetos histopatológicos, o TCG demonstra células poligonais com pequenos núcleos e abundante citoplasma eosinofílico pálido e granular. O núcleo é colocado de forma excêntrica, hipercromático ou vesicular. As células são geralmente organizadas em camadas, mas também podem ser encontradas em forma de cordões e ninhos. As bordas das células são geralmente indistintas e às vezes, o tumor parece infiltrar o tecido conjuntivo adjacente.2, 4 Ocasionalmente pode haver uma visível transição entre células granulares e células musculares esqueléticas normais, e alguns feixes de nervos mostram‑se circundados por células granulares.4

Em lesões envolvendo a língua a hiperplasia pseudo‑epiteliomatosa (HPE) pode ser tão pronunciada que o TCG, tem sido interpretado como um carcinoma de células escamosas.

Nestes casos, é muito importante realizar a biópsia corretamente, extraindo uma amostra adequada, que inclua todos os elementos necessários para um estudo histopatológico correto, com a finalidade de excluir tal possibilidade.1, 2, 4

Estudos utilizando a imunohistoquímica, sugerem uma origem neural ou neuroectodérmica das células granulares. A origem neurogénica é compatível com a imunomarcação para a enolase específica de neurónio e marcadores de proteínaS‑100 nas células do tumor.5

Tendo em conta o acima exposto, o objetivo deste relato é descrever dois casos de TCG com ênfase nos aspetos clínico, histopatológico e imunohistoquímico, com acompanhamento clínico e ausência de recidiva por mais de 10 anos.

Casos clínicos

Caso clínico 1

Paciente de sexo masculino, caucasiano, com 36 anos de idade, apresentou queixa de uma lesão em região de dorso de língua, de coloração levemente amarelada. O mesmo relatou que a lesão havia surgido há cerca de 6 meses, e que recentemente aparentava ligeiro crescimento, não relatando ter havido qualquer traumatismo no local da lesão. Não foi encontrado nenhum sinal de linfoadenopatia cervical ou submandibular.

A história médica e o exame físico extraoral, não revelaram nenhum dado significante. O exame clínico revelou uma massa assintomática, delimitada, firme à palpação, de coloração ligeiramente amarelada, de superfície idêntica à mucosa do dorso lingual, com cerca de 0,7 cm de diâmetro no dorso da língua, em sua metade esquerda (Figuras 1 e 2).

 

 

 

Uma biópsia excisional com margem de segurança de aproximadamente 0,3 cm distante das bordas da lesão, foi realizada com bisturi, sob anestesia local infiltrativa utilizando solução estéril injetável de cloridrato de prilocaína 3% (30 mg/mL) em associação com felipressina 0,03 UI/mL. O material obtido na biópsia foi fixado em formol a 10% e encaminhado para exame anatomopatológico, que confirmou o diagnóstico de TCG. O presente caso, vem sendo acompanhado há 12 anos, por meio de contato telefônico com o paciente que ocorre anualmente, sendo que, até o presente momento não ocorreu a recidiva da lesão, conforme relatado pelo paciente.

Caso clínico 2

Paciente de sexo feminino, caucasiana, com 11 anos de idade, compareceu com queixa de uma lesão em região de dorso de língua, de coloração levemente róseo‑amarelada.

Esta relatou que a lesão havia surgido há cerca de 3 meses, e que recentemente aparentava ligeiro crescimento. Não foi encontrado nenhum sinal de linfoadenopatia cervical ou submandibular. A história médica e o exame físico extraoral, não revelaram nenhum dado significante. O exame clínico revelou uma massa nodular assintomática, firme à palpação, de coloração ligeiramente róseo‑amarelada, de superfície idêntica à mucosa do dorso lingual, com cerca de 0,5 cm de diâmetro no dorso da língua em sua metade esquerda em região posterior (Figuras 3 e 4).

 

 

 

Uma biópsia excisional com margem de segurança de aproximadamente 0,3 cm distante das bordas da lesão, foi realizada com bisturi, sob anestesia local infiltrativa utilizando solução estéril injetável de cloridrato de prilocaína 3% (30 mg/mL) em associação com felipressina 0,03 UI/mL, o diagnóstico de TCG foi encontrado, após a fixação do material retirado ser fixado em formol a 10% e ser encaminhado para exame anatomopatológico. O presente caso vem sendo acompanhado há 10 anos, através de contato telefônico que ocorre anualmente, não sendo encontrada recidiva da lesão, conforme relato da paciente.

Em ambos os casos clínicos as hipóteses diagnósticas foram de: fibroma, lipoma, schwanoma, neurofibroma, neuroma e TCG. No exame anatomopatológico de ambos os casos clínicos, os cortes histológicos revelaram células não encapsuladas

arranjadas em camadas, ninhos e cordões. As células demonstravam ser poligonais com abundante citoplasma eosinofílico pálido, com núcleo vesicular pequeno, bordas indistintas associadas a células musculares estriadas e a nervos (Figuras 5 e 6). Foram identificadas, exuberante acantose e HPE no epitélio de recobrimento, não sendo encontrado necrose ou alterações displásicas nas células estudadas (Figuras 7 e 8). A análise imunohistoquímica de ambos os casos revelou positividade para a proteína S‑100 (Figuras 9 e 10).

 

 

 

 

 

 

 

Discussão e conclusões

O TCG é um tumor raro, com aspetos bastante controversos. Embora, estudos mostrem que o TCG, ocorra mais frequentemente entre a quarta a sexta décadas de vida, esta lesão é pouco frequente em crianças.3, 6 Ainda existe controvérsia sobre a predisposição do TCG para o género feminino, no entanto, apesar de não universalmente aceite, há especulação quanto a possibilidade da mediação de hormonas femininas na patogénese da doença.2Neste estudo, os pacientes eram um homem adulto e uma criança, denotando serem raras as manifestações dos TCGs relatadas neste estudo.

Muitos autores descrevem que as lesões de TCG são mais comuns na língua, como apresentado nos casos relatados neste trabalho. No entanto, esta lesão também pode afetar outros sítios intraorais e extraorais, como a mucosa oral, palato duro, esófago, estômago, músculo.2, 3, 7

Clinicamente, a lesão de TCG é pequena, solitária, bem circunscrita e amarelada; raramente excedem 3 cm no tamanho, geralmente é assintomática,8 dados estes compatíveis com os encontrados nos casos clínicos apresentados. O diagnóstico diferencial TCG é importante para distinguir de outros tumores benignos do tecido conjuntivo, tais como, fibroma, lipoma, schwanoma, neurofibroma, neuroma e carcinoma de células escamosas,9 tais hipóteses diagnosticas, foram levantadas em ambos os casos clínicos deste trabalho.

Alterações na superfície da mucosa como a HPE, podem surgir durante a evolução de uma lesão, sendo estas, importantes no diagnóstico, podendo em alguns casos, levar a suspeita de malignidade.9 O fenómeno da HPE é incomum em outros tumores benignos do tecido conjuntivo, mas frequente no TCG. Em ambos os casos mostrados neste trabalho, o exame histopatológico, a HPE foi claramente observada.

A biópsia excisional, com margem de segurança seguida de exame anatomopatológico, são essenciais para o correto diagnóstico e tratamento do TCG. Recidivas são raras, mas quando ocorrem pode ser devido à remoção inadequada.2 Nos dois casos apresentados neste trabalho, não houve recidiva após a excisão completa, conforme o acompanhamento clínico superior a 10 anos de cada lesão.

No presente estudo, ambos os casos mostram HPE no epitélio e corroboram com a ocorrência da HPE em 50 a 80% casos de TCG.4 Até o momento não foi demonstrado que a HPE tenha influência no prognóstico do TCG, mas acredita‑se que, este é um dado muito importante na análise histopatológica, já que em algumas circunstâncias esta pode induzir ao erro no diagnóstico e a um tratamento mais agressivo baseado no diagnóstico errado de malignidade.4, 10

Nas primeiras descrições da lesão, acreditava‑se que sua origem decorria de células musculares estriadas. Posteriormente apareceram novas hipóteses, baseadas em estudos imunohistoquímicos que indicavam ser células mesenquimais indiferenciadas, células derivadas da crista neural, histócitos e células de Schwann. Baseando‑se na positividade para a S‑100, como em ambos os casos estudados nestetrabalho, para a Enolase neuroespecífica e vimentina, a hipótese hoje mais aceita é que o TCG deriva de células de Schwann.2, 6, 9, 10

Apesar de sua origem controversa e da possibilidade de malignidade, o prognóstico de TCG após excisão completa da lesão com margens de segurança, é muito favorável, além do que, a lesão tem crescimento lento, ausência de comportamento agressivo e baixa recorrência.7, 10 Condições estas inteiramente consistentes com os resultados que encontramos nos casos apresentados neste trabalho.

No caso clínico apresentado, os achados clínicos, histopatológicos, tratamento e o acompanhamento clínico, quando correlacionados, permitiram verificar que, a manifestação do TCG se mostrou incomum, por se tratar de uma criança e um adulto do sexo masculino, a presença de HPE e de células granulares positivas para proteína de S‑100, ajudaram e diagnosticar corretamente as lesões estudadas e a excisão completa da lesão, seguida de acompanhamento prolongado, assegurou o sucesso do tratamento realizado.

 

Referências

1. Vered M, Carpenter WN, Buchner A. Granular cell tumor of the oral cavity: Updated immunohistochemical profile. J Oral Pathol Med. 2009;38:150‑9.

2. Eguia A, Urribari A, Gay Escoda C, Crovetto MA, Martinez‑Conde R, Aguirre JM. Granular cell tumor: report of 8 intraoral cases. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2006;11:E425‑8.

3. van de Loo S, Thunnissen E, Postmus P, van der Waal I. Granular cell tumor of the oral cavity; a case series including a case of metachronous occurrence in the tongue and the lung. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2015;20:e30‑3.

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5. Rejas RA, Campos MS, Cortes AR, Pinto DD, de Sousa SC. The neural histogenetic origin of the oral granular cell tumor: An immunohistochemical evidence. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2011;16:e6‑10.

6. Nishida M, Inoue M, Yanai A, Matsumoto T. Malignant granular cell tumor in masseter muscle: case report. J Oral Maxilofac Surg. 2000;58:345‑8.

7. Bandyopadhyay D, Sen S, Bandyopadhyay JP. Granular cell tumor on vaccination scar in young girl. Indian J Dermatol. 2006;51:196‑7.

8. Tirthankar G, Anupam Das, Kaushik S, Bandyopadhyay D, Das D, Saha A. Granular cell tumor: an uncommon begin neoplasm. Indian J Dermatol. 2015;60:322.

9. Angiero F, Crippa R, Stefani M. Granular cells tumour in the oral cavity: report of eleven cases treated with laser surgery. Minerva Stomatol. 2006; 55:423‑30.

10. Melo AUC, Ribeiro CF, Melo GC, Martins‑Filho PRS, Ramalho LMP, Albuquerque Junior RLC. Tumores de celulas granulares na lingua: relato de 2 casos. Rev Port Estomatol Med Dent Cir Maxilofac. 2012;53:159‑64.

 

*Autor correspondente:

Marcelo Sivieri de Araújo

Correio electrónico: msivieri68@gmail.com

 

Responsabilidades éticas

Proteção de pessoas e animais. Os autores declaram que os procedimentos seguidos estavam de acordo com os regulamentos da comissão de investigação clinica e ética relevante e de acordo com os do Código de Ética da Associação Medica Mundial (Declaração de Helsínquia).

Confidencialidade dos dados. Os autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.

Direito à privacidade e consentimento escrito. Os autores declaram ter recebido consentimento escrito dos pacientes e/ou sujeitos mencionados no artigo. O autor para correspondência esta na posse deste documento.

 

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

 

Historial do artigo:

Recebido a 31 de maio de 2019

Aceite a 9 de outubro de 2019

On-linea 22 de outubro de 2019