Revista Portuguesa de Estomatologia, Medicina Dentária e Cirurgia Maxilofacial
SPEMD - Rev Port Estomatol Med Dent Cir Maxilofac | 2018 | 59 (2) | 125-130
Caso ClÍnico
Duas propostas cirúrgicas para frenectomia labial – convencional e a laser de alta potência
Two surgical proposals for labial frenectomy – conventional and high-power laser
a Universidade Federal do Maranhão, São Luís, Maranhão, Brasil
b Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil
Andréa D N Lago - adnlago@gmail.com
Article Info
Rev Port Estomatol Med Dent Cir Maxilofac
Volume - 59
Issue - 2
Caso ClÍnico
Pages - 125-130
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Article History
Received on 09/02/2018
Accepted on 10/08/2018
Available Online on 10/09/2018
Keywords
Caso Clínico
Duas propostas cirúrgicas para frenectomia labial convencional e a laser de alta potência
Two surgical proposals for labial frenectomy conventional and high-power laser
Amanda F de S Pinheiroa, Guilherme S Furtadoa, Herbert H Sanderb, Liana L L Serraa, Andréa D N Lagoa,*
a Universidade Federal do Maranhão, São Luís, Maranhão, Brasil
b Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil
http://doi.org/10.24873/j.rpemd.2018.09.228
Resumo
O objetivo deste trabalho é relatar dois casos clínicos de frenectomia labial, sendo um realizado pela técnica convencional, e o outro utilizando LASER de diodo de alta potência quanto a presença de sangramento transcirúrgico, tempo cirúrgico, dor, edema e inflamação pós-cirúrgica, necessidade de medicação e aspecto do tecido mucoso após sete dias. Dois pacientes procuraram atendimento na Clínica do Curso de Odontologia da Universidade Federal do Maranhão com indicação de frenectomia. No paciente 1 optou-se pela técnica cirúrgica convencional e no paciente 2 pelo laser de diodo de alta potência. As duas cirurgias aconteceram ao mesmo tempo, para que a comparação fosse possível. A frenectomia a laser se mostrou bastante conveniente, por permitir ausência de sangramento trans e pós-cirúrgico, não haver necessidade de medicação pré ou pós-cirúrgica, ausência de dor, tempo cirúrgico menor e ausência de edema e inflamação após 7 dias, quando comparada à convencional.
Palavras-chave: Cirurgia a laser, Freio labial, Procedimentos cirúrgicos bucais
Abstract
The aim of this study was to report two clinical cases of labial frenectomy, one performed by the conventional technique and the other using a high-power laser, regarding the presence of trans-surgical bleeding, surgical time, pain, post-surgical edema and inflammation, need for medication, and mucosal tissue appearance after seven days. Two patients sought care at the Clinic of Dentistry at the Federal University of Maranhão with an indication of frenectomy. We opted for the conventional surgical technique in patient 1 and for the high-power diode laser in patient 2. The two surgeries happened at the same time so that comparison would be possible. Laser frenectomy proved to be very convenient since there was no trans- and postoperative bleeding, no need for pre- or post-surgical medication, no pain, no edema nor inflammation after seven days, and the surgical time was shorter, when compared to conventional.
Keywords: Laser therapy, Labial frenulum, Oral surgical procedures
Introdução
O freio labial é uma prega da mucosa bucal com formato triangular ou em lâmina de faca, de origem congênita, constituída por tecido fibroso ou fibromuscular recoberto por membrana mucosa, que se estende da face interna do lábio até o limite mucogengival, na região dos incisivos centrais. 1, 2, 3 Por limitar movimentos dos lábios, impede excessiva exposição gengival e promove estabilização da linha média. 2, 4
No entanto, existem casos em que a inserção do freio ultrapassa o limite mucogengival, provocando tração anormal do lábio e da gengiva marginal, dificultando movimentação labial e promovendo retração gengival e exposição radicular. 5, 6
Para diagnóstico correto das anomalias do freio labial, são necessários exames clínico e radiográfico. O exame clínico consiste, fundamentalmente, em tracionar o lábio e localizar visualmente a região de isquemia.4 Freio anormal comummente produz isquemia na face palatina da papila, e geralmente vem acompanhado de diastema mediano interincisivo. 3, 7 - 9
Exame radiográfico faz-se necessário para descartar presença de dentes supranumerários ou ausência da fusão dos processos maxilares.3,
Frenectomia é indicada quando o freio estiver associado à inflamação da gengiva, resultante da dificuldade de higiene, recessão gengival, vestíbulo raso, ou provocar diastema interincisivo, interferindo na estética, na fonação e na adaptação de próteses.4,7 Frenectomia pode ser realizada pela técnica convencional com bisturi, eletrocautério, ou a LASER de alta potência. 6, 7, 10, 11
A técnica utilizando LASER de alta potência é uma opção que tem demonstrado resultados bastante satisfatórios, por apresentar alta precisão de incisão e redução do tempo cirúrgico, pois corta, vaporiza, coagula e esteriliza, 9 - 11 além de não necessitar de sutura, na grande maioria dos casos. 1, 3, 7, 10, 12
A montagem do campo operatório tradicional também é dispensada, tal como utilização de diversos instrumentos, o que pode facilitar aceitação da cirurgia, principalmente por pacientes odontopediátricos, 11 - 12 uma vez que só é necessário o LASER e o jogo clínico de atendimento.
O aspeto durante a cirurgia é bastante favorável, devido à ausência de sangramento. 10, 11 A quantidade de anestésico, o tempo de cicatrização, a dor e o edema também são reduzidos quando se utiliza o LASER para realizar a frenectomia. 6, 8, 10
Diante do exposto, o objetivo deste trabalho é relatar dois casos clínicos de frenectomia labial, sendo um realizado pela técnica convencional, e o outro utilizando LASER de díodo de alta potência, apresentando alguns critérios para comparar as duas técnicas quanto ao trans-operatório (tempo gasto durante a cirurgia, quantidade de material utilizado), a dor pós-operatória e a utilização de medicação, embasados na literatura pertinente e avaliando os pacientes após 7 dias da cirurgia.
Casos clínicos
Caso clínico 1
Paciente do género masculino, 39 anos, buscou atendimento na Clínica III do Curso de Odontologia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), para realização de frenectomia, após ter sido encaminhado por ortodontista. Nenhuma alteração relevante foi relatada na anamnese.
Ao tracionar o lábio superior, foi possível observar diastema interincisivos e nítida isquemia na região da papila entre incisivos centrais superiores, indicando inserção anormal do freio (Figura 1). Optou-se pela frenectomia utilizando técnica cirúrgica convencional. O paciente estava sob controle periodontal, sem sítios inflamados e com índice de placa inferior a 20%. Foi administrado, via oral a medicação de Dexametasona 4 mg (Laboratório Medley, Brasil) uma hora antes do procedimento.
O procedimento cirúrgico consistiu em:
1) Antissepsia extraoral com Clorexidina 2% (Rioquímica, Brasil);
2) Antissepsia intraoral com Clorexidina 0,12% (Periogard/Colgate, Brasil);
3) Anestesia infiltrativa com Lidocaína 2% com epinefrina 1:100.000 (1 anestubo) (DFL, Brasil);
4) Pinçamento do freio com pinça hemostática (Figura 2)(Golgran, Brasil);
5) Incisão com lâmina de bisturi número 15 (Solidor, Brasil);
6) Remoção do freio (Figura 3);
7) Divulsão com pinça dente de rato (Golgran, Brasil) e descolador de Molt (Golgran, Brasil);
8) Sutura com fio de nylon 5.0 (Figura 4) (Procare, China). Recomendações pós-cirúrgicas foram dadas ao paciente, bem como prescrição farmacológica de analgésico (Paracetamol 750 mg, Laboratório Medley Brasil, a cada 6 horas, durante 1 dia). O paciente retornou após uma semana, para remoção da sutura e avaliação pós-operatória, relatando dor na região durante os quatro primeiros dias, mas sem relato de sinais de inflamação ou edema. O aspeto após sete dias era de uma região edemaciada com uma discreta inflamação na região da sutura (Figura 5).
Caso clínico 2
Paciente do género feminino, 17 anos, buscou atendimento na Clínica III do Curso de Odontologia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) onde funcionava o Projeto de Extensão Laserterapia na Odontologia, queixando-se de incômodo promovido pelo freio labial e dificuldade de higienização.
Nenhuma alteração relevante foi relatada na anamnese. Ao exame clínico, notou-se freio labial volumoso, curto e que tracionava a papila e dificultava a higienização da área (Figura 6). A paciente apresentava controle periodontal, sem sítios inflamados e índice de placa inferior a 20%. Foi indicada frenectomia utilizando LASER de diodo de alta potência (DMC, Brasil), cujo meio ativo é um sólido semicondutor associado ao arseneto, gálio e alumínio, com sistema de entrega através de fibra ótica (Figura 7), comprimento de onda na faixa do infravermelho 808 nm, potência de 2 W, 120 J de energia, modo pulsado e taxa de repetição de 20 pps (pulsos por segundos).
Não houve necessidade de medicação pré-cirúrgica.
O procedimento consistiu em:
1) Antissepsia extraoral com Clorexidina 2%(Rioquímica, Brasil);
2) Antissepsia intraoral com Clorexidina 0,12%(Periogard/ Colgate, Brasil);
3) Anestesia infiltrativa com Lidocaína 2% com epinefrina 1:100.000 (1/2 anestubo) (DFL, Brasil);
4) Remoção do freio labial com LASER de díodo de alta potência (Figuras 8 e 9) (Therapy Surgery, DMC, São Carlos, SP, Brasil).
Após sete dias (Figura 10), a paciente retornou para avaliação pós-operatória, relatando não ter sofrido episódios de dor, edema ou inflamação após cirurgia, não tendo feito, portanto, uso de medicação analgésica ou anti-inflamatória. Foi utilizado um cronômetro digital (DS Diagnóstica, Brasil) para que fosse possível avaliar o tempo gasto durante as duas cirurgias.
Discussão e conclusões
LASER de alta potência tem sido introduzido em cirurgias de tecido mole, como frenectomia labial, por proporcionar melhores condições trans e pós-operatórias, sendo recurso promissor nesta área. 3, 7, 8 - 10 O utilizado no caso relatado foi LASER de diodo de alta potência, que apresenta grande afinidade por tecidos pigmentados e hemoglobina, sendo indicado para tecidos moles, por promover corte e coagulação. 3, 4, 10
O LASER de díodo utilizado no caso é de fácil transporte, por se tratar de modelo portátil, e seu meio de entrega se dá por fibra óptica, o que contribui para seu menor custo de manutenção quando comparado com aparelhos semelhantes que utilizam pontas de safira, como é o caso do LASER Er,Cr:YSGG, por exemplo.
Alguns autores relatam realização de frenectomia somente com utilização de anestésico tópico, 6, 12 no entanto, estudos mais recentes apontam para necessidade de anestesia local, mas em menor quantidade. 1, 9, 10 Na frenectomia a LASER, utilizou-se apenas meio tubo de anestésico (cerca de 0,9ml), o qual se mostrou eficaz para controle da sensibilidade trans-operatória enquanto que, na cirurgia convencional, foi necessário um anestubo inteiro.
O sangramento durante a frenectomia a LASER foi ausente, acordando com o encontrado por outros autores(5,9) na literatura que utilizaram LASER de alta potência para a realização deste tipo de cirurgia. Este achado não foi surpreendente, uma vez que os LASERs de alta potência têm capacidade de hemostasia dos vasos superficiais,1,3,9,10 proporcionando campo cirúrgico limpo e de fácil visualização, sendo menos traumático para os pacientes odontopediátricos e pacientes adultos. 3, 4, 11
Já na frenectomia pela técnica convencional, o sangramento foi evidente. A literatura relata que, na grande maioria das frenectomias realizadas com LASER de alta potência, não há necessidade de sutura, devido à hemostasia conseguida pelo LASER, 2, 3, 9, 10 que permite deixar ferida aberta. Nesses casos, cicatrização ocorre por segunda intenção.1 Por outro lado, são raros relatos de frenectomia convencional sem uso de sutura, a qual se faz necessária para conter coágulo e possibilitar cicatrização por primeira intenção.
Na cirurgia a LASER relatada neste trabalho não houve necessidade de sutura enquanto que, na convencional, foi necessária sutura, em concordância com achados na literatura de vários autores que realizaram frenectomia com a técnica convencional necessitando de sutura, 2, 8 pois o objetivo da sutura é segurar o coágulo para que o processo de cicatrização se inicie e aconteça por primeira intenção. Como a técnica que se utiliza o LASER não ocorre sangramento, a cicatrização se dá por segunda intenção e sem necessidade de sutura.
As duas cirurgias aconteceram ao mesmo tempo para que a avaliação do tempo operatório pudesse ser realizada mais fielmente e com o auxílio de um cronômetro digital foi possível mensurar o tempo gasto. E na cirurgia a LASER o tempo operatório foi de 11 minutos e 15 segundos a menos que a cirurgia convencional.
Houve diferença de tempos cirúrgicos entre as duas cirurgias realizadas, podendo esta diferença estar relacionada ao operador, às características do freio ou a técnica utilizada.
Cirurgias a LASER são, em geral, mais rápidas, devido ao poder de corte bastante preciso 10, 12 e menor sangramento local, 3, 9, 10 permitindo melhor visualização e, consequentemente, maior agilidade no procedimento, além de utilização de menor quantidade de instrumental.
Alguns autores afirmam que incisões promovidas nos tecidos moles com LASER apresentam pós-operatório sem dor e inflamação, ou, quando presente, em menor grau de intensidade. 1, 3, 10 Isso pode ser explicado pelo fato do LASER causar menos danos aos tecidos adjacentes, pela homeostasia de vasos linfáticos e formação de coágulo de fibrina sobre a ferida cirúrgica, a qual fica protegida da irritação externa.1
Por esse motivo, a medicação pré-cirúrgica não se faz necessária, uma vez que o LASER já proporciona esses efeitos analgésicos e modulando o processo inflamatório. A paciente submetida à cirurgia a LASER relatou ausência de dor durante e após procedimento, sem que fosse necessário usar qualquer medicamento para controle de dor. Por outro lado, o paciente submetido à cirurgia pela técnica convencional relatou dor na região durante os quatro primeiros dias, além da necessidade de uso de medicação analgésica pós-cirúrgica durante um dia. Nenhum dos pacientes relatou edema, inflamação ou infeção, porém o paciente da técnica convencional apresentou a região um pouco edemaciada e hiperemiada em torno da ferida cirúrgica.
Alguns trabalhos sugerem que o LASER gera feridas cirúrgicas de menor extensão e que cicatrizam mais rapidamente, quando comparadas àquelas oriundas de cirurgia convencional. 3, 6, 7, 10 Vale salientar que, a partir do conhecimento de que LASER de alta potência apresenta efeitos térmicos, podendo realmente carbonizar tecidos, existe a necessidade de que se conheça seu mecanismo de ação, seus parâmetros e a técnica correta de irradiação, pois dessa forma não é provocado necrose e/ou carbonização no tecido.5
Assim, com este trabalho foi possível concluir que o LASER de díodo de alta potência foi eficaz na cirurgia de frenectomia labial, demonstrando ausência de sangramento nos momentos trans e pós-cirúrgicos, ausência de necessidade de sutura e nem de medicação pré ou pós-cirúrgica. Além disso, no caso clínico em que frenectomia foi realizada com uso de LASER, houve ausência de dor e tempo cirúrgico menor, sendo uma técnica alternativa com indicadores positivos para a sua utilização.
Trabalhos clínicos randomizados precisam ser executados para que ocorra esta validação clínica encontrada neste trabalho.
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Andréa D N Lago
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Responsabilidades éticas
Proteção de pessoas e animais. Os autores declaram que para esta investigação não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.
Confidencialidade dos dados. Os autores declaram ter seguido os protocolos do seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes.
Direito à privacidade e consentimento escrito. Os autores declaram ter recebido consentimento escrito dos pacientes e/ou sujeitos mencionados no artigo. O autor para correspondência está na posse deste documento.
Conflito de interesses
Os autores declaram não haver conflito de interesses.
Historial do artigo:
Recebido a 9 de fevereiro de 2018
Aceite a 8 de agosto de 2018
On-line a 10 de setembro de 2018