Resumo

Objetivos: Os períodos de confinamento decorrentes da COVID- 19 levaram a mudanças consideráveis no estilo de vida das crianças em todo o mundo. Sabendo das condicionantes e necessidade de reajuste de todas as rotinas, e partindo do pressuposto de que os cuidadores exercem uma influência decisiva na educação para a saúde e na garantia de medidas preventivas aos seus filhos este estudo pretendeu avaliar retrospetivamente e, em certa medida, comparar o eventual impacto desta conjuntura nas atitudes de saúde oral, acesso a cuidados dentários e hábitos alimentares em crianças portuguesas, bem como a perceção do cuidador sobre o estado de saúde oral das suas crianças. Materiais e métodos: Estudo observacional transversal que envolveu cuidadores de crianças portuguesas de 3 a 17 anos que com elas coabitaram durante o último período de confinamento por COVID- 19 em Portugal. O protocolo foi aprovado por uma Comissão de ética e os cuidadores que consentiram por escrito participar preencheram um questionário anónimo, semiestruturado e baseado em publicações anteriores, disponível online (junho?dezembro 2021. Os domínios visados permitiram a caracterização sociodemográfica, mudanças de rotina, hábitos alimentares, práticas de higiene oral, acesso à consulta dentária e percepção do cuidador sobre o estado de saúde oral da criança, tendo a funcionalidade do questionário sido aferida preliminarmente. Foi estabelecida estatisticamente a dimensão requerida da amostra e realizou- se a análise estatística descritiva e inferencial dos dados (teste Qui?quadrado; nível de significância α=0,05). Resultados: Obtiveram- se 386 questionários, nos quais 78.2% reportava alterações significativas da rotina das crianças neste período. Cerca de 17.1% consumiu guloseimas 2- 3 vezes por dia, havendo consumo excessivo deste tipo de alimentos entre famílias sem perda relevante de rendimentos (p=0.551). 72.2% negou impacto do confinamento nos hábitos de higiene oral, com 35.8% assumindo a falta de ajuda/supervisão durante a escovagem. As crianças com lesões de cárie não tratadas apresentaram práticas piores de higiene oral neste período (p=0.003). A maioria das crianças não foi sujeita a consultas de medicina dentária durante o confinamento. Conclusões: 46 rev port estomatol med dent cir maxilofac. 2021;63(S1):1-52 A condição oral da maioria das crianças da amostra não foi afetada significativamente durante o confinamento, contudo verificou-se um impacto não negligenciável de alguns fatores demográficos e comportamentais nos hábitos dietéticos e de cuidados de saúde oral.