Resumo

Introdução: O Pênfigo vulgar (PV) é uma doença autoimune caracterizada por bolhas mucocutâneas flácidas que facilmente rompem, deixando erosões dolorosas. Resulta da presença de autoanticorpos dirigidos contra constituintes dos desmossomas, nomeadamente as desmogleínas (Dsg) 1 e 3. Alguns fatores como fármacos, vacinas, infeções, doenças oncológicas e outras autoimunes podem predispor ao aparecimento de PV ou à sua exacerbação. Com a vacinação contra o coronavírus da Síndrome Respiratória Aguda Grave 2 (SARS?CoV- 2) foram reportadas múltiplas manifestações mucocutâneas, presumivelmente induzidas pelas vacinas. Descrição do caso clínico: Homem, 78 anos, com antecedentes de glaucoma, dislipidemia e arritmia, portador de pacemaker. Referiu quadro com 4 meses de evolução, caracterizado pelo aparecimento de bolhas na cavidade oral, frágeis e dolorosas, com compromisso da alimentação e perda ponderal de 8kg. Negou alteração da medicação habitual e história de infeções prévias. Referiu toma da 3.ª dose da vacina Cominarty em dezembro de 2021, com posterior aparecimento do quadro. Foi medicado com betametasona e sucralfato, solução oral, com pouca melhoria. Observavam- se erosões dispersas pelo palato mole, úvula e pilares amigdalinos, com 5mm de maior diâmetro, sem outras lesões cutâneas ou mucosas. Analiticamente destacava- se positividade para anticorpos anti-Dsg 3. O resultado histológico de uma das erosões revelou mucosa pavimentosa com formação de fendas intra-epiteliais supra-basais, com uma camada de células basais cuboides em tombstone, compatíveis com doença bolhosa acantolítca, nomeadamente PV. Realizou prednisolona 40 mg/dia, durante duas semanas, verificando-se melhoria ligeira. Iniciou duas infusões de rituximab 1g separadas por 15 dias, tendo- se verificado resolução completa das lesões da cavidade oral duas semanas após a segunda infusão. Verificava-se também recuperação do peso e ligeira disfonia após este período. Discussão e conclusões: Em- 24 rev port estomatol med dent cir maxilofac. 2021;63(S1):1-52 bora o PV induzido pela vacinação seja raramente reportado, a intensa vacinação atual pode predispor ao incremento de novos casos ou ao seu agravamento, em indivíduos geneticamente predispostos. Apesar de não haver ainda evidência clara entre as vacinas contra a SARS-CoV-2 e o PV, a associação temporal entre os dois eventos sugere uma relação causal. Este caso clínico pretende enaltecer a necessidade de estudos multidisciplinares para esta relação causa- efeito, sem detrimento da importância da vacinação contra a pandemia atual.