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Revista Portuguesa de Estomatologia, Medicina Dentária e Cirurgia Maxilofacial

SPEMD | 2017 | 58 (3) | 153-160




Investigação Original

Alterações cefalométricas esqueléticas em pacientes em crescimento submetidos a tratamento com recurso a aparelhos funcionais

Skeletal cephalometric modifications in growing patients submitted to functional appliances treatment


a Instituto Universitário de Ciências da Saúde, CESPU
b Instituto de Investigacão e Formação Avançada em Ciências e Tecnologias da Saúde, CESPU, Rua Central de Gandra, 1317, 4585-116 Gandra PRD, Portugal; 2. IBMC - Inst. Biologia Molecular e Celular; 3. i3S - Inst. Inovação e Investigação em Saúde, Universidade do Porto

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Investigação original

 

Alterações cefalométricas esqueléticas em pacientes em crescimento submetidos a tratamento com recurso a aparelhos funcionais

Skeletal cephalometric modifications in growing patients submitted to functional appliances treatment

 

João Vaza, Teresa Pinhob,*

aInstituto Universitário de Ciências da Saúde, CESPU bInstituto de Investigacão e Formação Avançada em Ciências e Tecnologias da Saúde, CESPU, Rua Central de Gandra, 1317, 4585-116 Gandra PRD, Portugal; 2. IBMC – Inst. Biologia Molecular e Celular; 3. i3S – Inst. Inovação e Investigação em Saúde, Universidade do Porto.

 

*Correspondence to:

 

http://doi.org/10.24873/j.rpemd.2017.10.021

 

Resumo

Objetivo: Estudar os efeitos esqueléticos em pacientes tratados com aparelhos funcionais removíveis.

Métodos: Foram estudados vinte pacientes com classe II e telerradiografia antes e após a finalização do tratamento. Foi efetuada a comparação dos efeitos do tratamento e a sua correlação com o sexo, biótipo facial, características esqueléticas e dentárias, tipo de aparelho utilizado e estádio de maturação das vértebras cervicais. O controlo foi efetuado através da teleradiografia inicial, utilizando os modelos padronizados de Jacobson e o programa Nemoceph®, fazendo uma previsão de crescimento individualizado. Os dados foram tratados com o software SPSS® e utilizou-se um nível de significância de 0.05.

Resultados: Redução significativa nos valores dos ângulos SNA e ANB e um aumento significativo do ângulo SNB no grupo em estudo. Para os parâmetros Na-Gn e Go-Gn não se registou qualquer diferença entre os dois grupos. As medidas S-Go, Ar-Go e Ar-Gn sofreram um aumento extra no grupo submetido a tratamento. Não foi encontrada diferença significativa entre os três tipos de biótipo facial e os vários parâmetros analisados. Da mesma forma, também para os diferentes estádios de maturação vertebral não foi encontrada diferença estatisticamente significativa para as várias medidas.

Conclusões: O tratamento de pacientes classes II em crescimento com recurso a aparelhos funcionais, leva a uma redução do ANB por diminuição do SNA e por aumento do SNB. Também as medidas S-Go, Ar-Go e Ar-Gn aumentaram significativamente, contribuindo para a correção da classe II, seja por aumento da dimensão vertical posterior (importante para a rotação anti-horária da mandíbula), seja por aumento do tamanho mandibular. (Rev Port Estomatol Med Dent Cir Maxilofac. 2017;58(3):153-160)

Palavras-chave: Aparelhos funcionais, Classe II, Crescimento mandibular, MCP de Jacobson, Reposicionamento mandibular, Restrição do crescimento maxilar

 

Abstract

Objective: The goal of this study was to observe the skeletal effects in patients treated with removal functional appliances.

Material and methods: Twenty patients with class II and teleradiography before and after the end of the treatment. Comparison of treatment effects and their correlation with sex, facial biotype, skeletal and dental characteristics, type of appliance used and maturation stage of the cervical vertebrae were done. Control was performed through the initial tele-radiography, using the Jacobson templates and the NemocephR program, making an individualized prevision of growth. Data were treated with SPSSR software. The level of significance was set at 0,05.

Results: We obtained statistically significant reduction of the measures SNA and ANB and increased SNB in the treated group. The measures Na-Gn and Go-Gn had no differences between the treated and the simulated growth group. The measures S-Go, Ar-Go and Ar-Gn were improved in the treated group. It wasn´t found differences in correlation amongst the three types of biotipe and its response to treatment. Similarly, the cervical vertebral maturation stages showed no statistically significant changes of the parameters.

Conclusion: The class II growing patients treatment carried out by functional appliances leads to correction of ANB, by SNA decrease and SNB improvement. Likewise, S-Go, Ar-Go and Ar-Gn measures significantly increase, contributing for the class II correction increasing either mandibular length or posterior vertical dimension (important for anti-clock rotation). Both biotype and cervical vertebral maturation stages have no statistically influence in our study. (Rev Port Estomatol Med Dent Cir Maxilofac. 2017;58(3):153-160)

Keywords: Functional appliances, Class II, Mandibular growth, Jacobson´s proportionate templates, Mandibular repositioning, Maxillary growth restriction

 

Introdução

Têm sido propostos diversos aparelhos funcionais, fixos ou removíveis, bem como múltiplas tentativas para explicar os efeitos dentários e/ou esqueléticos e o modo de ação deste tipo de tratamento na má oclusão de classe II. Atualmente, apesar de existir uma larga aceitação e utilização destes dispositivos, permanecem ainda muitas dúvidas nesta área da Ortodontia. E, de facto, são múltiplas as questões que se têm colocado, entre as quais se destacam algumas, tais como:

Quais os indivíduos que respondem melhor ao tratamento funcional? Que características presentes nesses pacientes, permitem prever um melhor resultado? Qual o momento ideal para o início do tratamento? E o melhor método para saber esse momento? Que alterações provocam efectivamente os aparelhos funcionais, seja a nível dentário e esquelético, seja a nível tegumentar? Que aparelhos são mais eficazes?

Além destas, muitas outras questões têm vindo a ser debatidas e permanecem sem uma reposta clara, consensual e, principalmente, sem bases científicas irrefutáveis.

Algumas das razões pelas quais não existe maior consenso, reside no facto das limitações dos próprios estudos publicados, entre as quais se destacam: amostras pequenas, medidas angulares para avaliar a posição espacial dos maxilares, pontos cefalométricos difíceis de localizar nas radiografias, atribuição heterogénea e sem padronização de pontos a estudar pelos diversos autores, comparação de médias que na verdade não correspondem a variações individuais e ainda limitações inerentes na extrapolação de resultados obtidos de estudos em animais.1-11 Woodside publicou vários estudos onde refere que, apesar de todas estas limitações, parece ser evidente que os aparelhos funcionais provocam alterações, propondo oito factores através dos quais, essas alterações ocorrem: 1. Alterações dento-alveolares; 2. Restrição do crescimento anterior da maxila;3. Indução do crescimento mandibular; 4. Redirecionamento do crescimento condilar; 5. Defleção do ramo mandibular;6. Expressão horizontal do crescimento mandibular; 7. Alterações neuromusculares; 8. Alterações na cavidade glenóide.

Estes oito fatores, dependendo das características individuais e do próprio aparelho utilizado, contribuem de uma forma combinada para a correção da desarmonia.4,11

No que diz respeito ao momento ideal mais adequado na decisão de implementar a terapêutica funcional, apesar de haver igualmente alguma controvérsia, os estudos recentes têm vindo a demonstrar que, utilizando o método de identificação da idade óssea através da morfologia das vértebras cervicais, o momento mais indicado será entre o estádio III e IV, correspondente ao desenvolvimento da concavidade no bordo inferior da 3.ª e 4.ª vértebras cervicais, respetivamente. Este estádio de desenvolvimento corresponde ao pico de crescimento na fase da puberdade.12-18

Por razões éticas, o grupo controlo foi gerado através dos modelos cefalométricos padronizados de Jacobson (MCP), que utiliza transparências obtidas de uma amostra de pacientes em crescimento e que podem ser utilizadas na previsão do mesmo.19-21

O objetivo do presente estudo foi contribuir para a compreensão dos efeitos do tratamento com aparelhos funcionais removíveis em pacientes com classe II esquelética, comparando os seus efeitos com a simulação do próprio crescimento esperado caso não tivesse sido submetido a qualquer tratamento.19-24

A hipótese foi perceber se os aparelhos funcionais têm efeitos esqueléticos significativos quando utilizados em pacientes em crescimento.

Material e métodos

A amostra foi do tipo intencional, baseando-se num grupo de 20 pacientes tratados com aparelhos funcionais removíveis em clínica privada. Destes, 65,0% (n=13) eram pacientes do género masculino e 35,0% (n=7) pacientes do género feminino.

A idade média dos pacientes foi de 10,3 anos com desvio padrão (DP) de 1,7 anos (idade mínima 8,0 anos e idade máxima 13 anos), sendo que o género feminino apresentava uma idade média de 10,3 anos (DP=0,7 anos) e o género masculino de 10,2 anos (DP=0,5 anos). Foram usados como critérios de inclusão: perfil facial convexo, classe II esquelética (ANB ≥ 5.º), classe II molar (completa pelo menos de um dos lados podendo ser incompleta do outro lado), overjet ≥ 6mm, idades compreendidas entre os 8-15 ano, pacientes sem agenesias (exceto terceiros molares) e pacientes cooperantes. Como critérios de exclusão podemos enumerar: a ausência de classe II molar completa em pelo menos um dos lados, telerradiografias com fraca qualidade, pacientes submetidos a tratamento ortodôntico prévio, pacientes submetidos a tratamento ortodôntico adicional durante a fase de tratamento com aparelho funcional, história de cirurgia maxilofacial devida a traumatismo, malformação congénita craniofacial, assimetrias faciais e extrações de dentes permanentes durante o tratamento.

Os aparelhos funcionais utilizados foram o aparelho de Sander, Twin-Block, Trainer, Bass Dynamax e Bionator. A duração total de tratamento mínima foi de um ano e a máxima de três anos, sendo os pacientes instruídos a utilizar o aparelho cerca de vinte horas diárias. A determinação do biótipo obteve-se através do factor VERT de Ricketts. Os estádios de maturação cervical em que os pacientes se encontravam eram os estádios I, II e III.

Os pacientes foram submetidos a telerradiografias no início e final do tratamento e, através da data de cada momento, foi calculado o tempo total de tratamento. Assim, T0 é o momento antes do tratamento, T1 o momento após o tratamento e CP o momento virtual que corresponde à previsão do crescimento para o período de tratamento.

De seguida, fez-se a marcação dos pontos necessários aos respetivos traçados cefalométricos: S, ENA, ENP, A, B, Gn, Go, Ar, Na, Ba e Me. Marcou-se também o plano oclusal e o longo eixo dos incisivos superior e inferior. Subsequentemente foi feito o traçado cefalométrico.

Utilizando os dados contidos nos modelos cefalométricos padronizados (MCP), começou por se selecionar a transparência (Figura 1) correspondente à idade e sexo do paciente. No entanto, nos casos onde o tamanho global não encaixou no traçado cefalométrico foi necessário utilizar um MCP maior ou menor, uma vez que a idade cronológica e desenvolvimento fisiológico não têm necessariamente que coincidir. Nestas situações, é mais apropriado selecionar a transparência que melhor se adapte ao tamanho do traçado. Marcou-se o ponto médio S-J no MCP e no traçado. Este ponto, encontra-se a meia distancia entre o ponto S e o ponto J sendo que o ponto J é a confluência entre a perpendicular de S à linha Ba-Na. Posteriormente foi feita a sobreposição do ponto médio S-J do MCP e do traçado, rodando o MCP até que as linhas Ba-Na fossem paralelas (Figura 2). Se os triângulos Ba- S-Na no traçado e MCP coincidissem, procede-se com a análise. Se a base craniana anterior ou posterior fossem desproporcionalmente curtas ou longas, ou se o ângulo formado entre elas fosse excessivamente agudo ou obtuso, a sobreposição fazia-se utilizando o plano Ba-Na, com registo em Na. Fez-se depois a sobreposição do traçado inicial com a transparência, deslocando-se esta última para o ponto pretendido, mantendo sempre os planos S-J paralelos e calculou-se o crescimento previsto para o diferencial de tratamento. Por exemplo, para um paciente submetido a um ano e meio de tratamento, utilizar no traçado o mesmo intervalo de tempo. Após a marcação dos pontos pretendidos   (Ar, Na, ENA, ENP, Gn, Go e Pg) fez-se o traçado final dos mesmos para obter os valores referentes à previsão de crescimento para cada paciente. Nas Figuras 3, 4 e 5 podem ver-se exemplos de previsão de crescimento para um intervalo de tempo de 30 meses, referente aos pontos Na, A e Go, respetivamente.

 

 

 

 

 

 

Foram registados os valores iniciais com crescimento e após a terapia funcional, numa tabela individualizada e, finalmente, os dados foram tratados com o objetivo de averiguar o valor estatístico dos diferentes parâmetros previamente definidos como indicadores das alterações esqueléticas produzidas pelos aparelhos funcionais. Foi utilizada uma ficha clínica de forma a registar os dados pessoais, clínicos e cefalométricos de cada paciente. Os materiais utilizados foram a telerradiografia de perfil inicial e final, as transparências de Jacobson (MCPs), o programa cefalométrico Dental Studio – Nemoceph NX2006® e software SPSS (v. 20; SPSS Inc, Chicago, IL).

Os dados estão apresentados em forma mínimo, máximo, média, mediana e desvio padrão e através de alguns gráficos. No estudo comparativo entre dois instantes de tempo considerou-se o teste t-Student para medidas repetidas. Para as medidas repetidas simples, foi considerada a ANOVA, para a comparação dos três momentos estudados, seguida, sempre que necessário, de comparações múltiplas de médias com a correção de Bonferroni.

O estudo do efeito conjunto do tratamento e do Biótipo (com 3 níveis) sob os parâmetros em análise foi realizado com uma ANOVA para medidas repetidas com dois níveis de avaliação (dois momentos diferentes). A mesma abordagem foi considerada para estudar o efeito conjunto do tratamento e do estádio da maturação cervical (com três níveis). Os pressupostos de aplicabilidade das abordagens paramétricas, nomeadamente, a normalidade das populações subjacentes às amostras em estudo e a homogeneidade de variâncias foram avaliados, respetivamente, com o teste de Shapiro-Wilks e com o teste de Levene.

Para avaliar o erro de observação/medição (intra e inter-observador) das medidas envolvidas neste estudo, foram consideradas as observações repetidas dos vinte pacientes em estudo. As observações, realizadas por um observador em dois instantes de tempo (intra-observador) e por dois observadores independentes (inter-observador), sob traçados efetuados em momentos de tempo diferentes, foram avaliadas através do coeficiente de correlação intra-classes e através o teste t-Student para amostras emparelhadas.

Considerou-se um nível de significância de å=0.05. Todas as análises foram efetuadas com o software SPSS® (v. 20; SPSS Inc, Chicago, IL)

Resultados

Na avaliação do erro de observação/medição (intra e inter-observador) das medidas envolvidas, ambos os valores do coeficiente de correlação foram muito elevados e muito próximos entre si. É de notar que a amplitude dos intervalos de confiança a 95% de confiança para o CCI é foi muito pequena, o que reflete uma precisão significativa nas estimativas.

A Tabela 1 mostra os valores obtidos relativos aos 13 parâmetros avaliados no início (T0) e no final do tratamento (T1). Da sua análise, pode afirmar-se que houve um aumento dos valores médios dos parâmetros SNB, S-Go, Na-Gn, Ar-Go, Go-Gn, Ar-Gn, II-PM e da posição do primeiro molar superior (PMS) do início para o instante final, sendo, e de acordo com a análise estatística inferencial, este aumento significativo para todos os parâmetros (punilateral= pbilateral /2 < 0,05 em todos os casos). Relativamente aos parâmetros SNA, ANB, Wits, inclinação do plano palatino (IPP) e IS-PP, observaram-se menores valores médios destes parâmetros no final do tratamento, quando comparados com os correspondentes valores médios observados no instante basal.

 

 

De acordo com a análise inferencial as reduções observadas foram estatisticamente significativas (punilateral= pbiilateral /2 < 0,05), com exceção da redução verificada nos valores da inclinação do plano palatino (punilateral= pbiilateral /2 = 0,270/2=0,135). Para tentar quantificar, de alguma forma, o efeito do tratamento (quando este efeito existe) calculou-se a variação relativa de cada parâmetro relativamente ao instante T0. Ou seja, para os diferentes parâmetros calcularam-se as variações relativas de acordo com as seguintes expressões:

 

 

onde VRT1 e VRTCP´, representam, respetivamente, a variação relativa ao instante basal T0 do parâmetro X com tratamento e sem tratamento (os valores dos parâmetros no instante CP foram estimados de acordo com o que se esperaria obter, caso o paciente não fosse sujeito ao tratamento).

Os valores obtidos (Figura 6) permitem poder afirmar-se que o tratamento promove um aumento significativo dos valores médios dos parâmetros SNB, S-Go, Ar-Go e Ar-Gn, quando esses valores médios são comparados com os que se esperariam obter em caso de não tratamento. Há uma diminuição significativa dos valores médios dos parâmetros SNA e ANB, aquando da sua comparação com os que se esperariam obter em caso de não tratamento sendo que o parâmetro que mais impacto sofreu com o tratamento foi o ângulo ANB, com uma variação média deste ângulo de 26% relativamente ao início, seguindo-se os parâmetros Ar-Go, S-Go e Ar-Gn com uma variação média relativamente ao início de -11%, -7% e -6%, respetivamente.

 

 

O tratamento não teve influência significativa sobre os valores dos parâmetros Na-Gn e Go-Gn.

A ANOVA realizada para averiguar o efeito que o tratamento teve de acordo com o biótipo e estádio de maturação das vértebras cervicais não revelou diferenças estatisticamente significativas para os vários parâmetros.

Discussão

A utilização dos MCP na previsão de crescimento permite contornar as limitações de não haver um grupo de controlo externo. As normas apresentadas nas transparências específicas de cada sexo e idade, têm como base a amostra da “Michigan School Study”, que haviam sido já publicadas por Riolo, Moyers, McNamara e Hunter. Os dados de Michigan foram obtidos de indivíduos não submetidos a tratamento, com oclusões classe I e II.2,17, 19, 20

Quando um aparelho funcional é colocado, a mandíbula é posicionada anteriormente atuando reciprocamente uma força oposta, distalizante, na maxila. Apesar do efeito de crescimento da mandíbula obtido através de aparelhos funcionais ser ainda controverso, os resultados obtidos no grupo tratado, mostraram aumento significativo do ângulo SNB quando comparado ao seu valor se tivesse havido crescimento sem tratamento, bem como redução significativa dos ângulos ANB e SNA, reforçando a ideia de diversos autores que sugerem o avanço mandibular e a restrição maxilar combinadas para a correção das classe II. ,4 ,6 ,7 ,11 ,23 ,24 ,27 -29 ,32 ,33 No entanto, existem autores que não encontraram efeito restritivo do maxilar significativo após a utilização de aparelhos funcionais. 5 ,10 ,25 ,26 Tal discordância pode ser explicada por existirem situações que mascaram esse efeito restritivo na maxila, podendo acentuá-lo ou diminuí-lo. Na realidade, um dos efeitos da terapia funcional é a retroinclinação dos incisivos superiores originando uma aposição óssea na zona alveolar do ponto A, que poderá mascarar o efeito restritivo maxilar.30 Também o plano palatino tem tendência a rodar no sentido horário alterando espacialmente o ponto A.30,31 Por outro lado, quando as alterações provocadas pelo tratamento são avaliadas através de medidas angulares, o efeito restritivo sobre a maxila parece ser mais marcado, pois o crescimento dos ossos da base do crânio movimentam anteriormente o ponto Nasion, diminuindo o ângulo SNA e, dessa forma, aumentam virtualmente a eficiência do tratamento ortopédico. 5 ,23 31

Os locais onde se processam as alterações da mandíbula são também motivo de muita controvérsia. Segundo diversos autores, essas modificações morfológicas dão-se no corpo, ramo e côndilo mandibulares em níveis que ainda não estão devidamente qualificados nem quantificados. 5 ,12 ,28 -32 35 Os resultados do presente estudo, mostram que nos indivíduos sujeitos a tratamento houve um aumento significativo dos valores referentes às dimensões da mandíbula Ar-Go e Ar-Gn contrariamente à medida Go-Gn. Estes resultados são concordantes com diversos estudos que apontaram uma maior movimentação do côndilo para cima e para trás e do pogónion para baixo e para a frente, nos grupos tratados, indicando um maior aumento do tamanho mandibular e apontando o côndilo e o ramo da mandíbula como zonas principais de crescimento. 5 ,22 -24 ,27 ,30 ,36 O presente estudo baseou-se no ponto Ar para determinar as alterações no ramo e tamanho total da mandíbula, não refletindo, por isso, diretamente o crescimento condilar. Sendo o ponto Ar uma estrutura determinada pela interceção da superfície faríngea da base craniana e pela face posterior do côndilo, a sua posição é determinada, apenas em parte, pela mandíbula. Segundo alguns autores, o ponto Ar pode perfeitamente ser utilizado para averiguar a alteração do tamanho mandibular mas deve ser utilizado com precaução para inferir concretamente sobre o crescimento no côndilo e/ou alterações espaciais na cavidade glenóide, uma vez que pode sobrevalorizar o crescimento condilar posterior e a movimentação inferior da cavidade glenoide ou ainda, subvalorizar o crescimento condilar superior. 33 ,

37

No entanto, os resultados da presente investigação relativos à altura facial posterior (S-Go), onde o aumento da altura do ramo e crescimento do côndilo têm certamente influência, reforçam que houve um aumento significativo com a submissão ao tratamento, tal como outros estudos.23 No que diz respeito à altura facial anterior (Na-Gn), não houve alterações significativas em nenhum dos grupos. Estes dados coadunam-se com diversos estudos, que apontam para a importância do aumento da altura facial posterior mais acentuada nos indivíduos submetidos a tratamento funcional, facilitando a rotação anti-horária mandibular e, por conseguinte, aumento da correcção das desarmonias de classe II esquelética. 12 ,30 ,33

Relativamente às alterações dento-alveolares, os nossos resultados revelaram-se de acordo com a grande maioria dos autores: obteve-se uma diminuição significativa da inclinação do incisivo superior e um aumento significativo da inclinação dos incisivos inferiores, tal como em vários estudos. 6 ,7 ,10 ,23 ,25 ,36

Há, no entanto, autores que não encontraram aumento significativo da inclinação do incisivo inferior.36

Contrariando alguns autores, 2 ,3 ,37 -39 relativamente à correlação do biótipo com ANB, Ar-Go, Go-Gn e Ar-Gn, não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os pacientes mesofacial, braquifacial e dolicofacial para as varias medidas analisadas, que se poderá dever à amostra ser pequena. A maioria da literatura defende que, para a terapia  funcional ser mais eficiente, deve iniciar-se quando estamos na presença de concavidades na segunda e terceira vértebras cervicais, onde vários autores obtiveram maior grau de correcção das classes II. 10 ,12 -14 ,16 ,17 Porém, no nosso estudo não observámos diferenças estatisticamente significativas entre os três grupos de maturação das vértebras cervicais. A explicação poderá estar no facto da distribuição desses grupos não estar equitativamente distribuída pela amostra, uma vez que para o estádio III apenas existem três pacientes. Além disso, existem diversos autores que defendem que este método deve ser utilizado com muita precaução18,40 ou mesmo que não deve ser utilizado para identificar os picos de crescimento da mandíbula uma vez que apesar de se conseguirem visualizar as diferenças na forma e tamanho das vértebras, não se conseguiram associar aos estádios de maturação correspondentes ao maior ou menor crescimento mandibular, em parte devido à grande subjetividade e ao seu carácter qualitativo em vez de quantitativo.41-45

Conclusão

Este trabalho vem corroborar a opinião das publicações que afirmam que durante o tratamento com aparelhos funcionais removíveis se maximiza o crescimento mandibular criando-se condições como o aumento da dimensão vertical posterior, que facilitam o reposicionamento anterior da mandíbula, aumentando significativamente o ângulo SNB.

Adicionalmente, com o efeito restritivo no maxilar superior, o tratamento ortopédico dos maxilares contribui taxativamente para a diminuição do ANB, corrigindo-se dessa forma a classe II.

 

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*Corresponding author:

Teresa Pinho

Correio eletrónico: teresa.pinho@iscsn.cespu.pt

 

Responsabilidades éticas

Proteção de pessoas e animais. Os autores declaram que os procedimentos seguidos estavam de acordo com os regulamentos da comissão de investigação clínica e ética relevante e de acordo com os do Código de Ética da Associação Médica Mundial (Declaração de Helsínquia).

Confidencialidade dos dados. Os autores declaram ter seguido os protocolos do seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes.

Direito à privacidade e consentimento escrito. Os autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.

 

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

 

Historial do artigo:

Recebido a 21 de Janeiro de 2017

Aceite a 6 de Setembro de 2017

On-line a 4 de Outubro de 2017